Bhagavat Gita - O Canto Celeste

Hare Sri Krisna Prabhu Nityananda Govinda Jay
"Que estas palavras alumiem nosso caminho até Ti"





BHAGAVAD GITA - O CANTO CELESTE - Mahabharata Cap XIV
As primeiras manobras da guerra começaram. Arjuna pegou o arco Gandiva e disse à Krishna “Ó Infalível, por favor, dirija a minha carruagem entre os dois exércitos para que eu possa ver o inimigo e como estão posicionados. Vá em frente, ó senhor, para que eu possa ver os que desejam lutar conosco hoje. Vamos ver os tolos que querem agradar o mente - suja, filho de Dhitarastra”
Krishna dirigiu os cavalos em frente e a bela carruagem moveu-se até o centro do campo. Krishna sorriu. “Apenas admire, Arjuna, todos os Kurus reunidos aqui.” Arjuna olhou pelo campo. Krishna podia entender sua mente. O longo tempo de espera pela guerra tinha enfim chegado, uma terrível batalha entre parentes. Agora não havia como voltar atrás. De repente vendo o horror da guerra que o esperava, Arjuna contemplou então seus parentes e amigos posicionados diante dele, homens que eram para ele como pais, irmãos, filhos e netos, assim como professores, tios, amigos e bem queridos.
Arjuna estava extasiado de compaixão. Como ele pôde ter alimentado a idéia de matar seus próprios psrentes e amigos? Ele se sentiu fraco, e falou à Krishna numa voz trêmulosa: “Meu querido senhor, vendo meus amigos e parentes em minha frente desejosos de guerrear, eu sinto minhas entranhas revirar e minha boca secar.”
O Arco de Arjuna então caiu ao chão da carruagem e seu corpo estremeceu. Sua pele estava em fogo e ele sentiu seu cabelo eriçado. “Ó Keshava, Eu não acho que posso continuar nesta batalha. Estou me esquecendo de mim e minha mente esta a girar. Parece-me que apenas azar e maus atos resultam desta batalha. Como pode ser de alguma maneira boa matar meus próprios parentes? Qual o valor da vitória se todos seus amigos e queridos estão mortos?
Arjuna caiu de joelhos. Não havia como lutar. Foi diferente quando ele enfrentou os Kauravas no campo de Virata. Naquele momento, ele não teve a intenção de matá-los. Ele apenas queria ensiná-los uma lição. Agora, no entanto, ou os Kauravas ou os Pandavas não voltariam para casa. Lágrimas caíram de seus olhos enquanto ele revelava seus sentimentos à Krishna.
“Ó Govinda, eu não tenho desejo de um reino à custa da vida de meus parentes. Quando vejo meus professores, pais, filhos, e tantos outros próximos e queridos parados à minha frente, minha sede de luta me abandona completamente. Mesmo que eles queiram a minha morte, eu jamais posso pensar em matá-los. Ó Janardana, eu não os mataria nem em troca dos três mundos, sozinho neste mundo. Eu não vejo que felicidade pode vir desta batalha.”
Suor cobria a testa de Arjuna. Sua respiração ficou ofegante. A visão de personalidades de idade e respeitadas como Bhisma, Drona, Shalya, e Bahlika, todos quem ele amava muito, o encheu de mágoa. Os vários príncipes jovens, filhos dos Kauravas e seus aliados, eram como seus próprios filhos, e ele sentiu compaixão por eles também. Até os filhos de Dhitarastra eram dignos de pena porque eram tão tolos. Que virtude viria em matá-los?
Arjuna implorou à Krishna. “Em minha opinião nós seríamos acometidos por pecado se matássemos esses agressores. Nosso dever correto seria certamente perdoá-los. Mesmo que tenham perdido a visão da virtude devido à ganância, nós mesmos não deveríamos esquecer os princípios religiosos da mesma maneira. Se matássemos os velhos chefes de família, os rituais tradicionais seriam esquecidos, e eles são essenciais para a vida religiosa. Sem tradição, a maioria da sociedade seria descrente de Deus. Matando os homens deixaremos as mulheres desprotegidas. Elas então seriam isca de homens pecaminosos e crianças indesejadas nasceriam. Quem iria educar essas crianças? Ó Krishna, eu seria responsável por essas calamidades sociais e seria merecedor de residência permanente no inferno.”
Lembrando seu treinamento moral, Arjuna baseou seus argumentos em leis védicas. Parecia para ele que matar seus parentes era claramente imoral, especialmente matando os mais velhos, que eram responsáveis por manter as tradições religiosas em sua dinastia. Certamente eles não deveriam nunca ser assassinados, especialmente pela causa dúbia de ganhar riqueza e reino.
Arjuna chorou. “Eu preferiria que os Kauravas me matassem, desarmado e sem resistência, do que erguer minhas armas contra eles pela causa de minha própria felicidade.” Ele jogou suas armas e se desmontou na carruagem.
Krishna ainda sorria levemente enquanto olhava a seu amigo afetado pela mágoa. Isto era uma demonstração não característica de covardia de uma pessoa tão bravamente corajosa. Ele respondeu firmemente à Arjuna. “Como podem essas impurezas chegarem até você numa hora tão crítica, ó Arjuna? Isto não é próprio de um homem que entende o verdadeiro valor da vida. Não o levará á planetas elevados, mas à degradação e infâmia. Ó filho de Kunti, não fomente tal impotência. É um tanto indevido. Desista dessa pequena fraqueza de coração e se erga, ó castigador de inimigos.”
Arjuna olhou surpreso à Krishna. O que ele queria dizer? Ele simplesmente dispensou todos seus argumentos. Krishna jamais dera conselho impróprio ou indevido. Ele era a personificação de todos os princípios religiosos. Arjuna estava perplexo. Por que Krishna tinha desconsiderado todas as considerações religiosas que ele tinha levantado? È claro, para um Kshatrya era sempre religioso lutar e checar os descrentes, mas esses não eram simples malfeitores. Bhishma, Drona, Kripa, e vários outros eram homens altamente respeitados que com muito cuidado seguiam os princípios religiosos.
Ainda tremendo, Arjuna perguntou, “Meu querido Krishna, apesar de que seja certo matar inimigos pecaminosos, como posso disparar flechas em homens dignos de minha reverência? Eu preferiria ser um pedinte a ganhar este mundo à custa da vida de tais homens. Mesmo que estejam cheios de ganância, eles ainda são meus superiores. Qual princípio religioso aprova a aniquilação deles? Se nós ganharmos a guerra todos nossos bens adquiridos por desosnetidade seriam manchados pelo sangue deles. Parece-me que vencer não é melhor do que perder, a vitória é sempre incerta, mas neste caso ela é indesejada. Como poderia viver depois de causar a morte de meus parentes? Mas ainda assim estão parados frente a mim com armas levantadas.”
Arjuna não podia ver como sair de tal situação. Os kauravas estavam claramente com a intenção de matá-lo e a seu exército. Ainda assim, ele não tinha o desejo de lutar. Nem parecia ser religioso. Mas ao mesmo tempo, seus argumentos religiosos não surtiram nenhum efeito em Krishna. Qual era seu dever agora? Havia apenas uma pessoa que podia ajudá-lo. Ele olhou para Krishna, que sentava pacificamente com as rédeas em suas mãos enluvadas. Foi pela ajuda de Krishna que Arjuna e seus irmãos sobreviveram a tantas dificuldades. Ele era sem dúvida o mais sábio. Ele saberia como agir.
Decidindo acatar qualquer decisão que Krishna aconselhasse, Arjuna disse, “Ó Krishna, estou confuso sobre meu dever, e perdi toda minha compostura devido á fraqueza de coração e a considerações egoísticas, e não estou sendo capaz de subjugá-las. Nesta condição eu peço que você, por favor, me diga o que é o melhor para mim. Agora sou seu discípulo e uma alma rendida à ti. Por favor, me instrua. Eu não vejo por que arrastar esta miséria. Mesmo ganhando um reino igual à dos Deuses, não consigo persuadir minha mágoa. Ó Govinda, eu não lutarei.”
Arjuna caiu em silêncio. Agora estava nas mãos de Krishna em convencê-lo a lutar. Do outro lado do campo Bhishma olhou com interesse a solitária carruagem de Arjuna parada no meio dos dois exércitos. Por que Arjuna não estava em posição? Ele parecia ter caído em sua carruagem. Algo estava havendo entre ele e Krishna. Bhishma levantou sua mão em ordem de segurar suas forças. Estaria Krishna considerando um esforço final para a paz? Mesmo ali no campo de batalha? Certamente não. As conchas já haviam sido sopradas sinalizando o começo da luta. O que quer que Krishna estivesse fazendo, Bhishma queria respeitar, ele então decidiu esperar que a carruagem de Arjuna se movesse para dar a ordem de carregar armas. Yudhisthira estava também segurando suas forças, então não havia necessidade de ação imediata.
Krishna agora sorria mais amplamente. Ele ficou feliz que Arjuna, seu amigo querido, estava pronto a aceitá-lo como professor e guia. Erguendo sua mão abençoando-o, ele disse, “Apesar de você falar sábias palavras das escrituras, você ainda lamenta por algo indigno de lamentação. Um homem sábio não lamenta nem pelos vivos nem pelos mortos. Ambos você, eu, e todos esses kshatriyas aqui reunidos sempre existimos e para sempre existiremos. Nós somos almas eternas, passando de corpo em corpo. Mesmo nesta vida nós vemos como o corpo muda, ainda que nós continuemos a mesma pessoa. Na mesma maneira, quando a morte chegar, nós receberemos um novo corpo. Uma pessoa auto-controlada não fica desconfortada por tal mudança.”
Ajoelhando aos pés de Krishna, Arjuna sentiu consolo imediato. Como sempre, Krishna tinha ido direto ao coração do assunto. Arjuna escutava atentamente enquanto Krishna continuou. “Ó filho de Kunti, felicidade e tristeza vêm e vão constantemente como as estações verão e inverno. Elas surgem apenas da percepção sensória, ó Bharata, o indivíduo deve tolerá-las sem se sentir perturbado. Uma pessoa capaz de tal tolerância é eleita de se liberar de toda a miséria. Os grandes videntes que conhecem a verdade concluíram após uma cuidadosa análise que a alma e a realidade espiritual são imutáveis, e o corpo material não possui fundamento nesta verdade. A alma penetra o corpo e é indestrutível. Ninguém pode destruir a imensurável e eterna alma, mas o corpo está certo que chegará ao fim. Então, lute sem nenhuma compaixão pelo corpo de seus parentes, ó Arjuna.”
Arjuna entendeu bem o que Krishna estava dizendo. A alma era certamente eterna; mas seria este um bom argumento para quem estava prestes a matar? Morte e seguintes nascimentos são experiências dolorosas para a alma.
Pelo amor que sentia a Arjuna e entendendo suas dúvidas, Krishna disse, “Nem aquele que acha que a entidade vivente é quem mata, nem aquele que pensa que é ela que morre usa de sabedoria, por que o Eu não mata nem pode ser morto. Porque para a alma não há jamais nascimento ou morte. Ela é incriada. Sem nascimento e sempre existindo, ela não morre com a morte do corpo. Sabendo disso, como pode você causar a morte de alguém? De fato, a morte do corpo permite que a alma receba um novo corpo, tal como uma pessoa veste novos ornamentos depois de descartar os antigos.”
Arjuna entendeu que Krishna estava assegurando-o que seus queridos parentes não seriam os perdedores. Matando seus corpos, Arjuna os liberaria de toda dor e sofrimento trazidos pelo seu presente Karma, e eles então receberiam um novo começo em um corpo melhor. Provavelmente em planetas mais elevados. Mas Arjuna estava preocupado que suas armas celestiais pudessem de alguma maneira ferir até a alma.
Krishna respondeu a esta dúvida. “Não há arma alguma, seja de fogo, vento ou água, que possa machucar ou ferir a alma. A alma é imutável imune a todos os efeitos materiais. A alma é descrita nos Vedas como invisível, inconcebível e imutável. O corpo é apenas a roupagem externa da alma indestrutível.”
Arjuna continuou em silêncio. Mesmo sabendo que Bhishma e Drona sendo almas eternas, ele ainda lamentava a idéia de sua morte. Krishna já havia instruído ele que tal lamentação era inevitável e devia ser tolerado, mas não iria ser fácil.
Krishna sorria afeiçoadamente a seu amigo. “Mesmo que você acredite que seu Eu seja o seu corpo, você ainda lamenta sem razão, ó herói bem armado. O corpo é matéria, e objetos materiais estão constantemente sendo criados e destruídos. Que homem sábio lamenta pela inevitável mudança à matéria trazida pelo tempo? Qualquer seja sua crença, os efeitos do tempo não podem ser detidos. Morte segue ao nascimento, e o nascimento segue a morte em devido tempo. Simplesmente cumpra seu dever sem lamentar-se, pois você não pode deter o curso do tempo, que é em ultimo caso a causa da morte de todos.”
Arjuna refletiu nas palavras de Krishna. Era difícil para ele compreender a existência da alma. Que era imortal e indestrutível tinha ficado bem claro, mas sua natureza real continuava um mistério.
Sem pausa, Krishna concluiu suas instruções sobre a alma. “Aqueles que conhecem a alma a consideram maravilhosa. Ela é descrita nos Vedas como maravilhosa. Mesmo aqueles que ouviram cada detalhe sobre a alma, ainda falham em compreendê-la completamente, contudo, ó descendente de Bharata, ela jamais poderá morrer. Pois então, desista dessa mágoa inútil por seus parentes.”
Krishna mudou de estratégia e começou a endereçar ao medo que Arjuna sentia que poderia pecar se matasse seus preceptores. “Você é um Kshatiya, Arjuna, e é seu maior dever lutar de acordo com os princípios religiosos. Você não deveria exitar assim. Melhor ainda, você deveria abraçar esta oportunidade, pois abre as portas do céu para ti. Se você não lutar, você cometerá pecado por negligenciar seu dever. Então você perderá sua boa reputação. Você perderá sua boa fama e para um homem respeitável desonra é pior que a morte. Ninguém vai pensar que você desistiu de lutar por compaixão. Eles acharão que você fugiu por medo e eles então perderão todo o respeito por você. O que poderia ser mais doloroso que isso?”
Ouvindo os compromissos á seus deveres como guerreiro desafiados, Arjuna começou a sentir-se desconfortável. O pensamento que ele pudesse cometer pecado era doloroso, e a perda de sua boa reputação seria intolerável. Krishna continuou.
“Ó Partha, nesta batalha há duas possibilidades: Você será morto e assim alcançará o céu, ou derrotará seus inimigos e então ganhará a Terra. Então, lute com determinação. Isto e também o meu desejo. Ó Partha, lute porque é seu dever sem pensar em tristeza ou felicidade, perda ou ganho, vitória ou derrota. Desta maneira você jamais pecará.”
Arjuna sentiu seu coração abrir enquanto ele absorvia as palavras de Krishna. Ele havia confrontado seu medo que ele iria sofrer e se tornar pecaminoso se lutasse. Na verdade seria pecado não lutar.
“Eu te disse algumas verdades existenciais a respeito da alma, ó filho de kunti. Escute agora enquanto eu falo sobre trabalhar sem desejo pelos resultados do trabalho, e então sem se enredar em reações kármicas. Este é o caminho para a Liberação. Uma vez que esteja neste caminho você não cairá novamente no abismo da existência material. Aqueles que estão neste caminho são desejosos apenas em servir o Supremo e são resolutos em cumprir seus deveres religiosos. Aqueles que procuram felicidade mundana, entretanto, são constantemente oprimidos por diversas tentações.
“Apenas homens pouco inteligentes se atraem aquelas seções dos Vedas que tratam a respeito da felicidade material. Desejando prazeres sensuais, opulência e poder, eles acham que não há nada mais há se viver. Eles se tornam tão atraídos por tais desejos que não podem fixar a mente na prática do Yoga. Não se deixe atrair por nada neste mundo, ó Partha. Se liberte de todas as dualidades de tristeza e felicidade. Estabelecido no Eu, desista de sua ansiedade de ganho material e segurança.”
Arjuna pôde entender que seus argumentos anteriores eram baseados apenas em felicidade material, mesmo que ele tenho se baseado na força da moralidade Védica, estava ficando claro que ele não pôde entender totalmente os Vedas e seu objetivo final. Havia princípios e verdades superiores. Krishna continuou a explicá-las.
“Os Vedas dão direções para conquistar felicidade material, ó Arjuna, mas há um propósito mais profundo por trás de toda instrução Védica. Aquele que conhece este propósito pode satisfazer todos seus desejos sem persegui-los separadamente, assim como uma pessoa que tem acesso a um grande rio não tem necessidade de poços e bicas. O grande objetivo desta vida é conseguido por trabalhar sem desejos dos frutos de sua ação, simplesmente porque é seu dever fazê-lo. Desta maneira você pode situar-se no Yoga, sem apego pelo sucesso ou fracasso em seu trabalho. Então você continuará intocado pelo pecado. Até suas reações karmicas anteriores serão destruídas por tal trabalho. Você então estará apto a obter o mais alto destino, a residência suprema de Deus, e estará liberto para sempre dos ciclos de nascimentos e mortes. Quando você não mais se atrair pelas promessas de felicidade material mostradas nos Vedas, e continuar sempre satisfeito pelo Eu apenas, você então se fixará na consciência divina que o levará a eterna liberação.”
Arjuna perguntou, “Como podemos reconhecer um homem nesta consciência divina, ó Krishna? Quais são suas características?”
“Tal pessoa não se delicia em prazeres sensuais, ó Partha, Ele está sempre satisfeito em si próprio. Nenhum tipo de miséria pode perturbá-lo, nem algum tipo de felicidade material. Ele vive sem apego, medo ou ira, e permanece sempre indiferente as dualidades deste mundo. Seus sentidos estão completamente sob seu domínio, mesmo que ainda experimente desejos sensórios. Sua mente está fixa no supremo e ele é sempre pacífico. Seu pensamento não habita sobre os objetos de prazer sensório, qual pode derrubar a mente até do yogi avançado na prática, e assim então ele se mantém livre de todo apego material. Devido a tal controle dos sentidos, sua inteligência permanece imperturbada e ele é então pacífico. Ó Arjuna, aquele que não têm os sentidos sob controle da mente não é pacífico. Como pode ele então ser feliz?”
Arjuna estava desconcertado, Krishna estava recomendando prática de yoga e controle dos sentidos para manter o indivíduo pacífico e ao mesmo tempo dizendo para ele lutar. Como podem estes conselhos serem compatíveis? “Ó Keshava, porque queres que me envolva nesta batalha horrível se achas que a prática do yoga e desapego são melhores? Certamente lutar requere que eu tenha o desejo de vencer. Estou confuso com suas instruções. Por favor me diga mais claramente qual o melhor caminho para mim nesta situação.”
“Ó livre de pecado Arjuna, existem dois caminhos para a liberação: o primeiro envolve renúncia e a busca por conhecimento, enquanto o segundo envolve trabalhar sem desejo de prazeres materiais. Ninguém pode atingir a perfeição pela simples renúncia, pois, pelo simples parar de trabalhar o indivíduo não se livrará de suas reações kármicas. Forçado pela sua própria natureza o homem é obrigado a agir a todo o momento, mesmo que esta ação seja só em sua mente. Retrair os sentidos enquanto permitir que a mente pense em prazeres materiais é inútil, ó Arjuna. Isto é simplesmente uma falsa prática do yoga. Muito melhor é o homem que usa sua inteligência para controlar seus sentidos e ao mesmo tempo trabalha sem apego e desejo de sucesso.”
Arjuna pensou em seu próprio caso. Mesmo que ele tentasse renunciar a batalha e permanecer indiferente, sua mente ainda agiria. Era provável que ele continuasse a pensar em Duryodhana e suas maldades, e como Yudhisthira teve seu reino roubado. Esses pensamentos iriam cedo ou tarde forçá-lo a levantar armas e lutar. Mas como alguém pode lutar sem apego?
“O trabalho deve ser feito como um sacrifício à Vishnu, ó bravo filho de Kunti. Isto é trabalhar sem se ligar ao fruto de seu labor. Qualquer outro tipo de trabalho causa apego neste mundo. Então lute apenas pela Sua satisfação. Por tal sacrifício, um homem pode suprir todas as necessidades desta vida e ao mesmo tempo progredir espiritualmente. Apenas um homem completamente auto-satisfeito não precisa realizar tal sacrifício.”
Arjuna pensou se ele seria capaz de manter-se auto-satisfeito. Ele já tinha alguma experiência com a prática de yoga e meditação. Ele realmente precisaria trabalhar de tal maneira?
Krishna sorriu. “Um homem verdadeiramente desligado de desejos não vê a necessidade de trabalhar, mas ele também não vê a necessidade de parar de trabalhar. Ele trabalha somente por ser seu dever e não alimenta desejos pelos resultados. Por este trabalho ele finalmente atinge o Supremo. Ele também dá o exemplo correto para os outros, pois o que quer que um grande homem faça será sempre seguido por homens comuns.”
Krishna estava pensando na posição de Arjuna na sociedade. Ele era altamente estimado como um líder e herói. Se ele desistisse de seu dever, mesmo que fosse qualificado à fazê-lo, seu exemplo seria seguido por homens menos qualificados. Krishna lembrou à Arjuna a história de um famoso rei, Janaka. Ele era conhecido como um avançado espiritualista e hábil em permanecer com a mente fixa em meditação no Supremo, Janaka obstante havia sempre continuado a cumprir seu dever como um monarca.
“Pense em meu próprio exemplo, ó Partha. Você conhece a minha identidade como Senhor Supremo de todos os mundos. Que dever há para mim? Mesmo assim, eu executo todos os deveres incumbentes a um homem em minha posição com muito cuidado. Se eu não o fizer, então todos os mundos iriam cair em ruína, pois todos os homens seguiriam meu exemplo.”
Arjuna conhecia Krishna como um chefe de família e membro da ordem real, assim sendo era escrupuloso em cumprir os deveres prescritos nos Vedas para um homem em tal posição. Era o exemplo perfeito.
“Aquele que conhece a verdade sabe bem a diferença entre trabalho feito visando prazeres materiais, e trabalho feito para o prazer do Supremo. Ó Arjuna, eu sou esse Supremo. Então, lute para a minha satisfação, sem desejo de ganho pessoal, sem qualquer clamor de propriedade e sem letargia. Aqueles que trabalham de acordo apenas com minhas instruções, com fé total à mim, atingem completa liberação. Aqueles que não consideram minha proibições, no entanto, são simples tolos e não atingiram nem a perfeição nem felicidade.”
Isto fazia sentido à Arjuna. Ele sempre compreendeu a divindade de Krishna, e este conhecimento sempre o manteve em águas mansas. Ele e seus irmãos sempre gozaram da proteção de Krishna, até o presente momento quando ele estava prestes a lutar à seu lado e enfrentar seus inimigos. Por que então todos os homens não sucumbiam às instruções de Krishna? Arjuna pronunciou sua dúvida. “Por que, querido Senhor, todos os homens não cumprem seus deveres religiosos?”
“Eles estão dominados pela cobiça, o maior inimigo deste mundo. Devido a tal excesso de desejo pelos objetos materiais, homens cometem atividades pecaminosas, sem saber do sofrimento que isto os causará. Cobiça não é jamais satisfeita. Melhor ainda, ela queima como fogo, e quando é frustrada, se transforma em ira. Um homem nesta condição é completamente desnorteado. Ó Arjuna, você deve supervisionar a cobiça pelo controle dos sentidos. Ou então isto irá destruir seu conhecimento e sua auto-realização. Escute agora enquanto eu explico sobre a ciência do sacrifício e autocontrole.”
Krishna disse à Arjuna que este conhecimento que estava compartilhando era muito antigo. Ele havia primeiramente dito ao Deus-Sol milhões de anos atrás. Ouvindo isto, Arjuna perguntou, “Como posso aceitar isto, Krishna? Parece que você apareceu neste mundo recentemente.”
“Ambos nós dois tivemos incontáveis nascimentos, ó Arjuna. Eu posso me lembrar de todos, mas você não. Na verdade eu nunca nasci como um homem comum. Meu corpo é transcendental e não muda nem se deteriora. Ainda assim eu pareço nascer em cada era. Eu venho apenas para estabelecer a religião e restringir a irreligião, Partha. Desta maneira eu salvo os devotos e aniquilo os demônios. Aquele que entende esta verdade sobre mim não terá que nascer novamente em corpo material. Aqueles que se refugiam em mim serão livres de atração a este mundo, medo e ira, e irão atingir puro e transcendental amor à mim. De acordo com sua própria fé, eu recíproco com todos os homens, ó Arjuna. Qualquer um pode me alcançar.”
Krishna explicou também que ele tinha arranjado para que todos os desejos materiais dos homens fossem saciados. Ele estava pronto a dar para qualquer pessoa qualquer coisa ela desejasse, fosse sensação de divertimento ou amor de Deus. Ele também não tinha nenhum interesse no mundo material e simplesmente agia reciprocamente com os desejos dos homens, e de acordo com seus merecimentos. Krishna mesmo era transcendental ao mundo material. Sabendo disso, todas as almas libertas do passado atingiram perfeição. Eles agiam apenas para a satisfação de Krishna. Tal trabalho não causa reação, sendo ele a Suprema transcendência.
Mas aqueles que renunciaram o trabalho, se esta renúncia não for para Sua satisfação, ainda causaria reação. Qualquer coisa feita na sua própria conta e risco, seja motivado por apego ou repulsão, carregava uma reação kármica.
Depois de descrever vários tipos de sacrifício, Krishna disse, “Todos os tipos de sacrifício são destinados a culminar em conhecimento transcendental, ou para que aquele indivíduo perceba sua verdadeira identidade como servidor eterno do Supremo. Esta é a fruta madura de todo o misticismo e queima às cinzas todas as reações kármicas acumuladas daquele indivíduo. Trabalhando com este conhecimento o indivíduo nunca mais se verá aflito pelas reações kármicas do trabalho. Todas suas dúvidas nasceram da ignorância, ó Arjuna, mate-as com a arma do conhecimento. Armado com o Yoga, ó Bharata, se erga e lute.”
Enquanto Krishna explicava como trabalhar com devoção, Arjuna começou a entender que isso era a verdadeira renúncia. Apenas dedicando todo o trabalho do indivíduo à satisfação do Supremo podia ele ser verdadeiramente desapegado. Krishna explicou que aquele que trabalha em tal consciência gradualmente chega ao ponto de sempre se lembrar do Supremo, ou Samadhi. Este tipo de Yoga não é menos eficaz que a pratica de austeridade e meditação; de fato, é mais fácil, do que desistir de tudo e meditar em um lugar solitário, o que seria difícil para Arjuna, um homem ativo do mundo. Para o conforto de Arjuna, Krishna deixou claro que isso não seria necessário. Ele também assegurou a Arjuna que o caminho do Yoga uma vez começado, nunca seria perdido. Mesmo que ele não alcançasse a liberação nesta vida, na próxima vida ele poderia retomar do ponto em que parou.
Tendo estabelecido que o lembrar constantemente o Supremo era o mais alto objetivo do Yoga, Krishna deixou seu próprio ponto de vista claro. “Sou eu quem deve ser sempre lembrado, ó Partha. Não há verdade superior a mim. Todas as coisas repousam sobre mim, como pérolas de um colar são presas à um fio. Eu sou o criador e destruidor de todos os mundos. As pessoas estão ocupadas demais em desejos materiais. Assim sendo elas não me conhecem, pois sou sempre transcendental a este mundo material. É difícil verdadeiramente superar a atração as coisas deste mundo material e seus engodos. Apenas os que se rendem em mim conseguem superar esta atração. Pode ser que leve muitos nascimentos e mortes de prática persistente de yoga, até que o indivíduo venha finalmente me compreender. São raras as almas que atingem tal perfeição. Devido a falta de inteligência, a maioria dos homens se contentam em adorar Deuses inferiores. Outros mais tolos ainda acham que superior à mim reside uma existência impessoal Suprema. Devido seus desejos materiais enraizados em si, tais pessoas nunca chegarão a me conhecer, apesar de eu ser o Senhor e Criador de todas as criaturas vivas.”
Arjuna estava se recompondo com os conselhos de Krishna. Em toda sua vida ele só pensou em Krishna como seu protetor e querido amigo. Agora Krishna estava lhe dizendo que isto é o ponto mais alto que qualquer indivíduo pode alcançar nesta vida. O maior feito que alguém pode conquistar nesta vida seria lembrar de Krishna no momento de sua morte, e assim alcançar sua eterna residência espiritual.
Mas isto leva uma vida inteira de prática. Arjuna escutava sem interrupção enquanto Krishna descrevia a melhor maneira de sempre lembrar-se Dele.
“Este é o Rei dos conhecimentos, Arjuna, o segredo dos segredos e a perfeição de todas as Religiões. Sou apenas Eu que devo ser idolatrado e servido com amor. Tolos não podem entender como eu posso assumir uma forma humana e aparecer neste mundo. Eles não conhecem minha natureza transcendental como o Senhor Supremo de todas as coisas. Homens inteligentes, no entanto, estão totalmente ocupadas em serviço devocional à mim. Eles estão sempre cantando minhas glórias, se empenhando em me agradar com muita determinação, se curvando diante mim, e me idolatrando com todos seus corações. Eu sempre irei pessoalmente proteger tais pessoas. Eu estou em dívida com qualquer um que com amor me ofereça mesmo uma folha, flor ou fruta. Sendo assim, você deveria fazer tudo como um oferecimento à mim, ó filho de Kunti. Deste modo você alcançará perfeição. Esta é a maior instrução. Empenhe sua mente em sempre lembrar de mim, seja meu devoto, ofereça reverências à mim, e me idolatre. Por tal absorção em mim, certamente você virá ter comigo, o objetivo maior da Vida.”
Arjuna estava olhando a seu amigo com espanto e amor. O Supremo Senhor tinha se tornado seu condutor de carruagem. Certamente isto era uma prova da recíproca de seu amor com seus devotos. Quem poderia jamais entendê-lo? Krishna parecia tão humano. Como poderiam as pessoas aceitar sua suprema natureza divina?
Novamente compreendendo as dúvidas de Arjuna, Krishna continuou. “Aqueles que são devotos à mim são capazes de conhecer minha posição e opulência. Porque você é meu querido amigo Arjuna, eu irei explicar mais a fundo sobre mim. Nem mesmo os semideuses e grandes místicos podem me conhecer completamente, pois em qualquer ponto eu sou sua fonte. Eu sou a fonte de todas as coisas, materiais e espirituais. Tudo emana de mim. O sábio que conhece isto perfeitamente se envolve completamente em serviço devocional à mim. Seus pensamentos sempre habitam em mim e eles sentem grande júbilo em falar sobre mim. Para aquele que constantemente me serve com amor, eu dou o entendimento pelo qual ele pode vir à mim. Com o clarão do conhecimento Eu destruo toda sua ignorância.”
Arjuna não tinha dúvida da posição de Krishna. Ele já havia testemunhado várias demonstrações de poder e opulência de Krishna, assim como havia ouvido inúmeras descrições de vários místicos e yogues. Agora Krishna estava deixando perfeitamente claro. Arjuna sentiu um sentimento misto de respeito e reverência. Erguendo as palmas das mãos e ajoelhado no chão da carruagem ele disse à Krishna, “Tu és a verdadeira Pessoa Suprema, a última morada, a verdade absoluta. Sem nascimento, eterno e transcendental, tu és o maior dos maiores e o possuidor de toda opulência. Isto é confirmado por grandes místicos que podem ver a verdade, tais como, Narada, Asita, Devala e Vyasadeva, e agora tu mesmo me declaras esta verdade. Ó Krishna, eu aceito totalmente tudo que me disseste como verdade. Ninguém pode compreendê-lo, nem mesmo os Deuses e Asuras. Somente tu podes te compreender pela sua própria potência, ó Senhor de todas as criaturas, Deus dos Deuses, Senhor do Universo!”
Sentindo uma onda de amor Divino, Arjuna pediu para Krishna se descrever um pouco além. “Diga-me como tu te difundes em todos os mundos, ó Senhor. Como deves ser lembrado e como você pode ser conhecido? Por favor, me diga em detalhes sobre seu poder místico e opulência. Eu nunca me canso de ouvir tais descrições e saborear o néctar de suas palavras mais e mais.”
“Minha opulência é sem limite, ó Arjuna, mas vou lhe dizer apenas da parte que é mais proeminente.”
Krishna explicou que mesmo que tudo fosse uma manifestação de sua energia e poder, ele iria denotar para Arjuna alguns atributos pelos quais ele poderia ser lembrado. Ele disse que Ele era Vishnu entre os Deuses, o Sol entre os planetas, Shiva entre os Rudras, e o monte Meru entre as montanhas. Ele se descreveu de várias maneiras, revelando à Arjuna como ele estava presente em tudo que Arjuna viu até então. Concluindo suas descrições, ele disse, “Saiba que toda opulência, beleza e gloriosas criações emanam de uma fagulha de meu esplendor. Há ainda a necessidade de mais informações detalhadas sobre mim? Com um pequeno fragmento de mim mesmo eu penetro e suporto este universo inteiro.”
Lágrimas correram a face de Arjuna. Lembrando como ele sempre brincava com Krishna, como se fossem iguais, ele disse com uma voz em choque, “Apenas por ilusão eu alguma vez o considerei como sendo um homem igual a mim. Esta ilusão agora foi dissipada, estou convencido de sua suprema posição. Mas, ó maior de todas as personalidades, ainda há muitos que não acreditarão nesta verdade. Por favor, então, mostre-se em toda sua majestade. Eu também quero ver esta grande forma que penetra e suporta todo este universo. Se eu for capaz de vê-lo, ó Senhor, por favor, mostre-se nesta forma para mim agora.”
Krishna consentiu com o pedido de Arjuna. “Veja agora minha opulência mística, ó filho de Kunti. Aqui estão minhas centenas de milhares de variadas e multicoloridas formas divinas. Meu querido Arjuna, eu lhe darei a visão divina, pois não poderá me ver com seus olhos materiais. Admire, ó melhor dos Bharatas, tudo o que você quer ver e tudo que você vai querer ver no futuro. Todos os objetos móveis e imóveis estão aqui, em um lugar.”
Enquanto Arjuna olhava em espanto, Krishna exibiu sua forma universal. Em Hastinapura ele havia executado apenas uma demonstração parcial desta forma, mas desta vez ele iria exibi-la por completo. Arjuna tornou-se consciente de uma imensa forma, possuindo ilimitadas bocas e olhos. Estava decorada com incontáveis ornamentos celestiais e segurava várias armas divinas. Coberta de vestimentas celestiais e guirlandas, ela era maravilhosa, brilhante, sem limites e se expandia para todos os lados. Parecia que se milhares de sóis brilhassem juntos no firmamento não se comparariam à refulgência de Suprema Personalidade de Deus nesta forma.
Arjuna sentiu seu cabelo eriçado. Ele curvou-se no chão da carruagem e ofereceu várias preces à Krishna. Nesta forma divina ele pôde ver todos os Deuses, encabeçados por Brahma e Shiva junto à todos os Rishis, Siddhas e Nagas. Cada tipo de ser criado aparecia naquela forma, todos os mundos eram visíveis, e nada era perdido.
Achando difícil olhar para esta forma universal, Arjuna disse, “ó inexaustível, este seu corpo ilimitado é maravilhoso, e ao mesmo tempo aterrorizante. Eu vejo todos os Deuses e Rishis parados frente á Ti, oferecendo-lhe preces. Como eles estão perturbados, assim estou eu, querido Senhor. Vendo esta tremenda manifestação estou perdendo minha paz mental e equilíbrio. Eu não posso olhar para estas faces que brilham como fogo. Todos os soldados de ambos os lados parecem estar sendo devorados nas amedrontadoras bocas destas faces. De fato, você esta destruindo todos os homens e todo o resto. Todas as coisas estão entrando em suas bocas como traças caem no fogo. Cobrindo todo o universo, você se manifesta com terríveis e ardentes raios.”
Arjuna estava tremendo. “Ó Senhor dos Senhores, de forma tão ameaçadora, por favor, me diga quem tu és e qual tua missão.”
A voz de Krishna parecia à Arjuna ressoar de todos os lados, enquanto ele respondia. “Eu sou o Tempo, ó Pharta, o grande destruidor de todos os mundos. Com a exceção de você e seus irmãos, e poucos outros, todos serão mortos. Isto acontecerá quer você lute ou não, Arjuna. Então cumpra seu dever como guerreiro e você se tornará um instrumento da minha vontade. Bhishma, Drona, e todos os heróis Kurus já estão mortos. Lute sem perturbação, Arjuna, e ganhará uma vitória gloriosa.”






* * *




Sentado frente à Dhitarastra, Sanjaya viu tudo o que acontecia entre Krishna e Arjuna. Ele descreveu tudo em detalhes ao rei cego, dizendo-lhe as exatas palavras pronunciadas por ambos os guerreiros. O Rei ficou maravilhado enquanto ele ouvia sobra a opulência divina de Krishna. Enquanto Sanjaya tentava descrever a forma universal, Dhitarastra sentiu seu coração tremer. Como seria possível que seus filhos enfrentassem tamanho poder e retornassem vivos? Agora Krishna estava dizendo que todos os heróis Kuru já estavam na realidade mortos e que isso foi arranjado pelo Supremo. Poderia isto ser verdade? Será que Krishna seria realmente capaz de realizar tal previsão? Parecia que nem tudo estava sob seu poder. Afinal ele veia até Hastinapura buscando paz e falhou nesta missão. Talvez ele também falhe na tarefa de satisfazer o desejo dos Pandavas em vencer esta batalha.
Sanjaya disse ao Rei o que Arjuna disse a Krishna, depois de ouvir que todos os guerreiros iriam morrer. “Arjuna podia entender a vontade de Krishna. Ele então respondeu, ‘Tudo isto é correto, ó Senhor. Tu és o protetor dos devotos e seres perfeitos e o destruidor dos ateístas e demônios. Isto será pelo bem de todos, pois até os demônios serão levados à razão por tal tratamento. Ó todo poderoso, todos deveriam simplesmente oferecê-lo reverências. Tu és o último santuário. Sabedor de tudo, tu és tudo o que há para se saber. Eu lhe beijarei os pés de lótus sempre. Minhas reverências por todos os lados a Ti, ó Senhor. Eu tenho, obviamente, te desrespeitado até agora. Por favor, me perdoe. Sem saber de todas suas glórias eu deitei na mesma cama que você, troquei-me de roupa em sua presença, e certamente te desonrei em várias maneiras por loucura ou amor. Ó infalível, me perdoe assim como um pai perdoa o filho, ou o amante sua amada.”
Sanjaya sentava com seus olhos fechados, assistindo tudo por meio de sua visão espiritual. Ele viu Arjuna se abaixando ao tocar os pés de Krishna. Enquanto Arjuna se levantava ele disse, “Ó todo-poderoso, vendo esta forma, qual nunca tinha visto, minha mente está cheia de medo. Por favor, me conceda a graça de ver a sua bela forma Vishnu, com seus quatro braço e ornamentos divinos.”
Krishna disse, “Com muita felicidade eu te mostrei, por meio de minha potência mística, esta forma universal suprema. Ninguém jamais viu esta forma. Por nenhum meio ela pode ser vista, ó Arjuna. Você ficou perturbado e amendrotado ao ver esta assustadora e horrível forma minha. Vamos terminar com isso, veja minha forma Narayana e tenha paz novamente.”
Krishna retraiu sua forma universal e Arjuna viu em sua frente a graciosa forma Narayana, com seus quatro braços segurando uma concha, roda, taco e flor de lótus. Após algum tempo aquela forma se alterou novamente para a forma de Krishna, com dois braços, da qual todas as outras formas emanam.
Arjuna se recompôs e ganhou novamente coragem. Krishna disse, “Ó Arjuna, apesar de minha forma universal seja de difícil admiração, é ainda mais difícil conhecer esta minha forma original. Os Deuses estão sempre buscando uma oportunidade de me ver como agora te apareço. Esta forma é a mais querida e pode ser conhecida somente por serviço devocional incondicional. Apenas desta maneira pode alguém entrar nos mistérios de meu entendimento.”
Enquanto Sanjaya repetia as palavras de Krishna para Dhitarastra, o Rei ouvia a respeito da ciência de Bhakti-yoga, ou serviço devocional. Krishna primeiramente explicou que há duas classes de transcendentalistas: Aquele que adoram a forma impessoal Suprema Brahman, a eterna energia espiritual que é a base de toda a existência; e aqueles que adoram a forma pessoal de Krishna.
“Desses dois tipos, aquele que fixa sua mente em minha forma pessoal, me idolatrando com toda fé e amor, é considerado o mais perfeito. Para a outra classe, avanço na vida espiritual é difícil, mas eles finalmente chegarão ao ponto de me idolatrar, quando sua realização amadurecer. De fato, ó Arjuna, Eu sou a base e origem de Brahman impessoal. Pois então me idolatre apenas. E Eu rapidamente resgatarei meus devotos do oceano de nascimento e morte. Eles então vêm ter comigo uma vida eterna de felicidade.”
Krishna então ensinou como começar na prática de Bhakti-yoga com um método gradual. Depois de descrever as qualidades encontradas em quem pratica o bhakti-yoga, ele explicou sobre a natureza material e a consciência. Fez descrições a respeito do Conhecedor, conhecimento e dos objetos de conhecimento, Krishna explicou em detalhes como Ele penetra a energia material e como Ele é a Super-alma presente em cada ser vivo. Ele então assegurou Arjuna sua completa habilidade em proteger e resgatar seus devotos.
Pelas instruções de Krishna, Arjuna pode entender que cada ser vivo é a causa de sua própria felicidade e tristeza. Por desejar inicialmente se desviar de Deus, ele foi posto sob influência da energia material. Então por se envolver com vários tipos de matéria, ele se torna mais e mais apegado, ficando atraído aos vários tipos de diversões materiais. Ele então é obrigado a nascer em várias espécies de vida. Durante todo este tempo a Super-alma o acompanha e testemunha todas suas ações. O Senhor é o que tudo vê e o sancionador das atividades da entidade vivente. Se a entidade vivente se voltar novamente à Deus, ele pode imediatamente se ver livre da matéria.
Krishna continuou. “Aqueles que podem ver a diferença entre corpo e alma, e que podem ver a Super-alma, estão eleitos a se aproximar da suprema residência espiritual. Tais pessoas não se degradarão neste mundo, mesmo que tenham se relacionado em ações materiais.”
Arjuna estava curioso em saber em como a alma se enredou primeiramente na energia material. Krishna explicou por completo. Com este conhecimento o indivíduo é capaz de se extrair da energia material. Arjuna perguntou quais eram as qualidades de uma pessoa que tenha atingido completa liberação do apego à matéria, e Krishna deu uma descrição completa. Ele concluiu dizendo, “Aquele que se compromete em serviço devocional á mim, sem falhar em nenhuma circunstância, é de uma só vez liberto da energia material e elevado à plataforma transcendental.”
Arjuna compreendeu que liberdade sobre a energia material não necessariamente significava deixar o mundo material. Simplesmente significava ficar livre de atração e apego as coisas materiais e trabalhar apenas para a satisfação do Senhor. Com este espírito que Arjuna deveria lutar. Krishna tinha claramente elaborado suas instruções iniciais para que Arjuna pudesse lutar sem apego ao mundo material.
Tendo dito a Arjuna o auspicioso caminho do Bhakti-yoga e as qualidades da pessoa neste caminho, Krishna então continuou descrevendo as pessoas ateístas que se viram cada vez mais de Deus. “Tais pessoas estão absorvidas no conceito de orgulho e falso prestígio. Eles são guiados pela cobiça e ganância, e acreditam que satisfazendo seus sentidos estão cumprindo as necessidades primordiais desta vida. Vivem perplexos por vários tipos de ansiedade, e presos à uma rede de ilusões, eles se tornam fortemente apegados aos prazeres materiais e assim caem no abismo do inferno. Eles então nascem em todos os tipos de baixas e abomináveis espécies como resultado de seus próprios desejos pecaminosos.”
“Aquele que não respeita as Leis das escrituras e age segundo seus próprios caprichos, alcançará no final apenas miséria.” Krishna concluiu suas instruções à Arjuna descrevendo como uma pessoa pode trabalhar com espírito de renúncia. “Com este espírito, ó Arjuna, Lute. Aquele que não é motivado pelo falso ego em pensar que o Eu e o corpo são a mesma coisa, o qual a inteligência não esta enredado em cálculos materiais de lucro e prejuízo, mesmo que ele mate homens neste mundo, na verdade ele não mata. Nem está preso à suas ações. Do mesmo modo aquele que escolhe não matar, baseado em seus cálculos materiais de lucro ou prejuízo é motivado apenas pelo ego falso, e se torna preso em reações karmicas.”
Arjuna acenou em confirmação. Ele entendeu. Suas hesitações em lutar nascerão da ignorância. Todas suas considerações foram egoísticas. Vendo seus queridos parentes frente à ele, ele se esqueceu de sua verdadeira natureza espiritual e se permitiu ser influenciado por sentimento mundano. Agora Krishna tinha acordado sua inteligência superior. Ele e todos os reis reunidos no campo de batalha são eternos servos de Deus, sua maior incumbência era realizar serviço devocional com amor ao Senhor. Este mesmo Senhor estava parado em frente à Arjuna e pedindo para ele lutar. Agindo de acordo com as instruções de Krishna, ele alcançaria perfeição, se tornando liberto de toda atração material, e alcançando a eterna residência de Deus.
Vendo que Arjuna tinha compreendido suas instruções, Krishna disse, “por você ser meu amigo mais querido, eu lhe expliquei completamente todo o conhecimento espiritual. Pense sobre isso com muita consideração e tome sua decisão. Meu conselho final é que você simplesmente se renda à mim e haja apenas para a minha satisfação. Esta é a moralidade suprema. Não há necessidade de nenhuma outra prática em yoga ou religião. Se você agir desta maneira, eu sempre lhe protegerei de reações pecaminosas. Não tema.”
Krishna olhou para Arjuna, sentado à seus pés. “Diga-me então, ó filho de kunti, você escutou tudo muito atenciosamente? Foram suas ilusões dissipadas?”
Arjuna se levantou na carruagem e segurou o arco Gandiva. “Meu querido Krishna, minhas ilusões se foram e por vossa misericórdia eu recuperei minha memória. Eu estou agora firme e livre de dúvida. Eu agirei de acordo com suas instruções divinas.”
Sentado em frente a Dhitarastra, Sanjaya disse, “Ouvindo esta conversa entre essas duas grandes almas, eu sinto meu cabelo eriçar, de tão profundo e maravilhoso tal diálogo. Meu coração esta palpitando. Só de lembrar a forma gigantesca de Krishna, eu me regojizo vez após outra. Aonde quer que esteja Krishna, o mestre de todo o misticismo, certamente haverá opulência, vitória, poder extraordinário e moralidade. Esta é minha opinião.”
Dhitarastra não disse nada. As previsões de Sanjaya certamente se tornariam reais. O velho rei se perguntou como é que poderia haver alguma esperança para seus filhos? Mas ainda não podia deixar de desejar que seus filhos vencessem a guerra. Era estranho. Mesmo que sua inteligência aceitasse o fato que Krishna, e qualquer pessoa que escolhesse o seu lado, não poderia ser vencido. O apego por seus filhos aumentou e sobrepôs sua inteligência. O conflito interno que ele sofria já era uma guerra. Ele não podia descansar ou dormir, mesmo que se sentisse fisicamente e emocionalmente sugado. De alguma maneira, ouvindo as instruções de Krishna à Arjuna o tinha acalmado, ainda que a posição de seus filhos parecesse ainda mais desesperançosa. Ele sentou segurando sua cabeça enquanto Sanjaya começou a descrever o início da Batalha.
FIM
(Tradução do 4ª capítulo da 2ª parte do épico “MAHABHARATA”, recontado por Krishna Dharma, editora torchlight, 2007, traduzido do inglês para o português sem fins editoriais ou lucrativos)